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sexta-feira, 10 de julho de 2009
Hoje, dia 10 de julho, comemora-se 500 anos do nascimento de João Calvino. Se você ouviu falar dele, talvez não tenha sido coisa boa. Possivelmente, associaram o nome dele a doutrinas difíceis de aceitar. Pensando nisso, resolvemos entrevistar o próprio e quem sabe lendo a entrevista a seguir, se desfaça essa má impressão sobre sua pessoa e ensino.
Cinco Solas: Comecemos pelo começo, como foi a sua conversão?
João Calvino: Inicialmente, visto eu me achar tão obstinadamente devotado às superstições do papado, para que pudesse desvencilhar-me com facilidade de tão profundo abismo de lama, Deus, por um ato súbito de conversão, subjugou e trouxe minha mente a uma disposição susceptível, a qual era mais empedernida em tais matérias do que se poderia esperar de mim naquele primeiro período de minha vida.
CS: Quer dizer então que sua aceitação do evangelho dos reformadores não foi imediata?
JC: Contrariado com a novidade, eu ouvia com muita má vontade e, no início, confesso, resisti com energia e irritação; porque foi com a maior dificuldade que fui induzido a confessar que, por toda minha vida, eu estivera na ignorância e no erro.
CS: Podemos dizer então que o senhor foi convencido pelos protestantes?
JC: É o Espírito Santo quem nos regenera e nos transforma em novas criaturas. A regeneração é o ato criador do Espírito Santo, implantando na alma um novo princípio de vida espiritual. A conversão é o primeiro exercício de desse novo princípio gracioso, voltando-se o pecador renascido espontaneamente para Deus.
CS: O senhor é acusado de incentivar a licenciosidade, por defender a doutrina conhecida como "uma vez salvo, salvo para sempre". O que tem a dizer a respeito?
JC: A herança da vida eterna já nos está garantida, visto, porém, que esta vida se assemelha a uma pista de corrida, temos que nos esforçar para alcançar a meta final. Aqueles que não perseveram são semelhantes ao indolente agricultor que só ara e semeia e então deixa o trabalho inacabado, quando aplainar é indispensável para evitar que a semente seja comida pelas aves ou crestada pelo sol ou destrída pela geada. Felizes porém são aqueles que abraçam o evangelho e permanecem nele!
CS: Isso significa, então, que um nascido de novo pode perder a salvação?
JC: Os eleitos acham-se fora do perigo da apostasia final, porquanto o Pai que lhes deu Cristo, seu Filho, para que sejam por Ele preservados, é maior do que todos, e Cristo promete (Jo 17:12) que cuidará de todos eles, a fim que nenhum deles venha a perecer. E Deus não frustra a esperança que Ele mesmo produz em nossas mentes através de Sua Palavra e não costuma ser mais liberal em prometer do que em ser fiel na concretização do que prometeu.
CS: Mas, permita-me insistir neste ponto, a doutrina da justificação pregada pelo senhor e pelos outros reformadores não desestimula a santidade?
JC: É certamente verdade que somos justificados em Cristo tão-somente pela misericórdia divina, mas é igualmente verdade e correto que todos quantos são justificados são chamados pelo Senhor para que vivam uma vida digna de sua vocação. Portanto, que os crentes aprendam a abraçá-lo, não somente para a justificação, mas também para a santificação, assim como Ele se nos deu para ambos os propósitos, para que não venham mutilá-lo com uma fé igualmente mutilada. O serviço do Senhor não só implica uma autêntica obediência, como também a vontade de por de lado seus desejos pecaminosos e submeter-se completamente à direção do Espírito Santo.
CS: O senhor também não é muito popular por causa da doutrina da predestinação...
JC: Só porque afirmo e mantenho que o mundo é dirigido e governado pela secreta providência de Deus, uma multidão de homens presunçosos se ergue contra mim alegando que apresento Deus como sendo o autor do pecado. Outros tudo fazem para destruir o eterno propósito divino da predestinação, pelo qual Deus distingue os réprobos e os eleitos.
CS: Mas o senhor concorda que essa doutrina é de fato polêmica, não concorda?
JC: A predestinação divina se constitui realmente num labirinto do qual a mente humana é completamente incapaz de desembaraçar-se. Mas a curiosidade humana é tão insistente que, quanto mais perigoso é um assunto, tanto mais ousadamente ela se precipita para ele. Daí, quando a predestinação acha-se em discussão, visto que o indivíduo não pode conter-se dentro de determinados limites, imediatamente, pois, mergulha nas profundezas do oceano de sua impetuosidade. Tenhamos, pois, em mente que será uma loucura querer conhecer todas as coisas relacionadas com a predestinação, exceto o que nos é dado na Palavra de Deus.
CS: Apesar dessa dificuldade, o senhor defende a doutrina da predestinação...
JC: O fundamento de nossa vocação é a eleição divina gratuita, pela qual fomos ordenados para a vida antes que fôssemos nascidos. Assim, a nossa vocação e a nossa justificação outra coisa não são que testemunhas da eleição divina, sendo que o Senhor introduziu na comunhão de sua Igreja aqueles que Ele havia preordenado antes de eles nascerem.
CS: Mas se Deus já escolheu a quem irá salvar, que sentido faz orar ou pregar o evangelho?
JC: A pregação é um instrumento para consecução da salvação dos crentes. A pregação é o instrumento da fé, por isso o Espírito Santo torna a pregação eficaz. Elimine-se o evangelho e todos permaneceremos malditos e mortos à vista de Deus. Esta mesma Palavra, por meio da qual somos gerados, passa a ser leite para nos criar, bem como alimento sólido para nossa nutrição contínua. E para incitar os verdadeiros crentes a uma mais profunda solicitude à oração, ele promete que, o que propusera fazer movido pelo seu próprio beneplácito, ele concederia em resposta aos seus pedidos. Tampouco existe alguma inconsistência entre estas duas verdades, a saber: que Deus preserva a igreja no exercício de sua soberana mercê, e que ele a preserva em resposta às orações de seu povo. Pois, visto que sua orações se acham conectadas às promessas graciosas, o efeito daquelas depende inteiramente destas. Aquele que confia na providência divina, deve fugir para Deus com orações e forte clamor.
CS: O senhor escreveu uma teologia sistemática e comentários para quase todos os livros da Bíblia. O que diria àqueles que estão pensando em ler algum livro seu?
JC: A respeito de minha doutrina, ensinei fielmente e Deus me deu a graça de escrever. Fiz isso de modo mais fiel possível e nunca corrompi uma só passagem da Escritura, nem conscientemente as distorci. Quando fui tentando a requintes, resisti à tentação e sempre estudei a simplicidade. Nunca escrevi nada com ódio a ninguém, mas sempre coloquei fielmente diante de mim o que julguei ser a glória de Deus.
CS: Para finalizar, que mensagem gostaria de deixar aos nossos leitores?
JC: O evangelho não é uma doutrina da fala, mas de vida. Não se pode assimilá-lo por meio da razão ou da memória, única e exclusivamente, pois só se chega a compreendê-lo totalmente quando ele possui toda a alma e penetra no mais profundo do coração. Os cristãos deveriam detestar aqueles que tem o evangelho nos lábios, porém não em seus corações.
Nota: As frases de João Calvino foram todas extraídas do livro Calvino de A a Z, de Hermisten Costa, publicado pela editora Vida.
Cinco Solas: Comecemos pelo começo, como foi a sua conversão?
João Calvino: Inicialmente, visto eu me achar tão obstinadamente devotado às superstições do papado, para que pudesse desvencilhar-me com facilidade de tão profundo abismo de lama, Deus, por um ato súbito de conversão, subjugou e trouxe minha mente a uma disposição susceptível, a qual era mais empedernida em tais matérias do que se poderia esperar de mim naquele primeiro período de minha vida.
CS: Quer dizer então que sua aceitação do evangelho dos reformadores não foi imediata?
JC: Contrariado com a novidade, eu ouvia com muita má vontade e, no início, confesso, resisti com energia e irritação; porque foi com a maior dificuldade que fui induzido a confessar que, por toda minha vida, eu estivera na ignorância e no erro.
CS: Podemos dizer então que o senhor foi convencido pelos protestantes?
JC: É o Espírito Santo quem nos regenera e nos transforma em novas criaturas. A regeneração é o ato criador do Espírito Santo, implantando na alma um novo princípio de vida espiritual. A conversão é o primeiro exercício de desse novo princípio gracioso, voltando-se o pecador renascido espontaneamente para Deus.
CS: O senhor é acusado de incentivar a licenciosidade, por defender a doutrina conhecida como "uma vez salvo, salvo para sempre". O que tem a dizer a respeito?
JC: A herança da vida eterna já nos está garantida, visto, porém, que esta vida se assemelha a uma pista de corrida, temos que nos esforçar para alcançar a meta final. Aqueles que não perseveram são semelhantes ao indolente agricultor que só ara e semeia e então deixa o trabalho inacabado, quando aplainar é indispensável para evitar que a semente seja comida pelas aves ou crestada pelo sol ou destrída pela geada. Felizes porém são aqueles que abraçam o evangelho e permanecem nele!
CS: Isso significa, então, que um nascido de novo pode perder a salvação?
JC: Os eleitos acham-se fora do perigo da apostasia final, porquanto o Pai que lhes deu Cristo, seu Filho, para que sejam por Ele preservados, é maior do que todos, e Cristo promete (Jo 17:12) que cuidará de todos eles, a fim que nenhum deles venha a perecer. E Deus não frustra a esperança que Ele mesmo produz em nossas mentes através de Sua Palavra e não costuma ser mais liberal em prometer do que em ser fiel na concretização do que prometeu.
CS: Mas, permita-me insistir neste ponto, a doutrina da justificação pregada pelo senhor e pelos outros reformadores não desestimula a santidade?
JC: É certamente verdade que somos justificados em Cristo tão-somente pela misericórdia divina, mas é igualmente verdade e correto que todos quantos são justificados são chamados pelo Senhor para que vivam uma vida digna de sua vocação. Portanto, que os crentes aprendam a abraçá-lo, não somente para a justificação, mas também para a santificação, assim como Ele se nos deu para ambos os propósitos, para que não venham mutilá-lo com uma fé igualmente mutilada. O serviço do Senhor não só implica uma autêntica obediência, como também a vontade de por de lado seus desejos pecaminosos e submeter-se completamente à direção do Espírito Santo.
CS: O senhor também não é muito popular por causa da doutrina da predestinação...
JC: Só porque afirmo e mantenho que o mundo é dirigido e governado pela secreta providência de Deus, uma multidão de homens presunçosos se ergue contra mim alegando que apresento Deus como sendo o autor do pecado. Outros tudo fazem para destruir o eterno propósito divino da predestinação, pelo qual Deus distingue os réprobos e os eleitos.
CS: Mas o senhor concorda que essa doutrina é de fato polêmica, não concorda?
JC: A predestinação divina se constitui realmente num labirinto do qual a mente humana é completamente incapaz de desembaraçar-se. Mas a curiosidade humana é tão insistente que, quanto mais perigoso é um assunto, tanto mais ousadamente ela se precipita para ele. Daí, quando a predestinação acha-se em discussão, visto que o indivíduo não pode conter-se dentro de determinados limites, imediatamente, pois, mergulha nas profundezas do oceano de sua impetuosidade. Tenhamos, pois, em mente que será uma loucura querer conhecer todas as coisas relacionadas com a predestinação, exceto o que nos é dado na Palavra de Deus.
CS: Apesar dessa dificuldade, o senhor defende a doutrina da predestinação...
JC: O fundamento de nossa vocação é a eleição divina gratuita, pela qual fomos ordenados para a vida antes que fôssemos nascidos. Assim, a nossa vocação e a nossa justificação outra coisa não são que testemunhas da eleição divina, sendo que o Senhor introduziu na comunhão de sua Igreja aqueles que Ele havia preordenado antes de eles nascerem.
CS: Mas se Deus já escolheu a quem irá salvar, que sentido faz orar ou pregar o evangelho?
JC: A pregação é um instrumento para consecução da salvação dos crentes. A pregação é o instrumento da fé, por isso o Espírito Santo torna a pregação eficaz. Elimine-se o evangelho e todos permaneceremos malditos e mortos à vista de Deus. Esta mesma Palavra, por meio da qual somos gerados, passa a ser leite para nos criar, bem como alimento sólido para nossa nutrição contínua. E para incitar os verdadeiros crentes a uma mais profunda solicitude à oração, ele promete que, o que propusera fazer movido pelo seu próprio beneplácito, ele concederia em resposta aos seus pedidos. Tampouco existe alguma inconsistência entre estas duas verdades, a saber: que Deus preserva a igreja no exercício de sua soberana mercê, e que ele a preserva em resposta às orações de seu povo. Pois, visto que sua orações se acham conectadas às promessas graciosas, o efeito daquelas depende inteiramente destas. Aquele que confia na providência divina, deve fugir para Deus com orações e forte clamor.
CS: O senhor escreveu uma teologia sistemática e comentários para quase todos os livros da Bíblia. O que diria àqueles que estão pensando em ler algum livro seu?
JC: A respeito de minha doutrina, ensinei fielmente e Deus me deu a graça de escrever. Fiz isso de modo mais fiel possível e nunca corrompi uma só passagem da Escritura, nem conscientemente as distorci. Quando fui tentando a requintes, resisti à tentação e sempre estudei a simplicidade. Nunca escrevi nada com ódio a ninguém, mas sempre coloquei fielmente diante de mim o que julguei ser a glória de Deus.
CS: Para finalizar, que mensagem gostaria de deixar aos nossos leitores?
JC: O evangelho não é uma doutrina da fala, mas de vida. Não se pode assimilá-lo por meio da razão ou da memória, única e exclusivamente, pois só se chega a compreendê-lo totalmente quando ele possui toda a alma e penetra no mais profundo do coração. Os cristãos deveriam detestar aqueles que tem o evangelho nos lábios, porém não em seus corações.
Nota: As frases de João Calvino foram todas extraídas do livro Calvino de A a Z, de Hermisten Costa, publicado pela editora Vida.
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8 comentários:
Paz Clóvis,
Otima entrevista, perguntas diretas, unidas as claras respostas de Calvino.
Gostei muito.
Em Cristo,
Ednaldo.
Caríssimo Clóvis,
Que bela entrevista! Uma idéia fantástica essa sua. Gostei tanto que vou postar no meu blog, como parte da Semana Calvino.
No amor de Cristo,
Roberto
Excelente postagens possui seu blog, teologia educativa e instrutiva.
Calvino foi o mentor da teologia no periodo reforma e pós reforma, é preciso considera-lo.
Acesse meu blog.www.vivendoteologia.blogspot.com
Ednaldo,
Obrigado pelas suas já habituais visitas e por seus comentários. Realmente, dá gosto ler Calvino, que consegue ser profundo e ao mesmo tempo claro.
Em Cristo,
Clovis
Roberto,
Obrigado pela sua apreciação e fique à vontade para publicar e divulgar os conteúdos do Cinco Solas.
Seu blog é excelente.
Clóvis
Danilo,
Deus te abençoe pela sua visita e por suas palavras. Oportunamente estarei conhecendo seu blog.
Em Cristo,
Clóvis
OLá Clóvis,
Realmente impressionante. Gostei bastante.
Quando escrevi o bate papo com Lewis estva achando que eu deveria estar ficando louco...hehehe...mas achei mais um também...
Daniel,
Meu pai dizia que de médico e de louco todo mundo tem um pouco. Alguém até sugeriu que eu andava "meio espírita" rsrs
Que Deus te abeçoe.
Em Cristo,
Clóvis
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