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domingo, 29 de setembro de 2013
A natureza dos ministros do Novo Testamento. São Paulo expõe de modo simples e conciso o que devemos pensar dos ministros do Novo Testamento ou da Igreja Cristã, e o que devemos atribuir-lhes: “Assim, pois, importa que os homens nos considerem como ministros de Cristo, e despenseiros dos mistérios de Deus” (I Co 4.1). Por isso, o apóstolo quer que estimemos os ministros como ministros. Ora, o apóstolo os chamou hyperétas, “remadores”, que têm os olhos fixos unicamente no timoneiro, e são, assim, homens que não vivem para si mesmos ou segundo sua própria vontade, mas para os outros - a saber, para os seus senhores, de cujas ordens dependem inteiramente. Pois em todos os seus deveres todo ministro da Igreja recebe ordens, não de satisfazer a sua vontade, mas de executar apenas o que está nos mandamentos recebidos do seu Senhor. E neste caso declarasse, expressamente, quem é o Senhor, isto é, Cristo, a quem os ministros estão sujeitos em todas as questões do ministério.

Os ministros, despenseiros dos mistérios de Deus. Contudo, para explicar mais completamente o ministério, o apóstolo acrescenta que os ministros da Igreja são ecónomos ou despenseiros dos mistérios de Deus. Ora, em muitas passagens, especialmente em Efésios, cap. 3, São Paulo chamou “mistérios de Deus” ao Evangelho de Cristo. E os escritores antigos também chamaram “mistérios” aos sacramentos de Cristo. Assim, é para isto que os ministros da Igreja são vocacionados - para pregarem o Evangelho de Cristo aos fiéis e para administrarem os sacramentos. Lemos, ainda, em outro lugar do Evangelho, a respeito do “mordomo fiel e prudente” a quem “o senhor confiará os seus conservas para dar-lhes o sustento a seu tempo” (Luc 12.42). Além disso, em outra passagem do Evangelho, um homem parte de viagem para um pais estrangeiro e, deixando sua casa, passa os seus bens e a sua autoridade nesta a seus servos, dando a cada um a sua tarefa.

Do poder dos ministros da Igreja. Agora, pois, convém falarmos algo também acerca do poder e do dever dos ministros da Igreja. Sobre esse poder alguns têm discutido diligentemente, e a ele sujeitaram tudo o que há de supremo valor na terra, e o fizeram contrariamente ao mandamento do Senhor, que proibiu aos seus discípulos o domínio e recomendou com insistência a humildade (Luc 22. 24 ss; Mat 18.3 ss; 20.25 ss). Há, na verdade, outro poder que é simples e absoluto, chamado o poder do direito. Segundo esse poder, todas as coisas do mundo inteiro estão sujeitas a Cristo, o Senhor, como ele mesmo declarou, dizendo: “Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mat 28.18). E ainda: “Eu sou o primeiro e o último, e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos, e tenho as chaves da morte e do inferno” (Apoc 1.18). Igualmente: “... aquele que tem a chave de David, que abre e ninguém fechará, e que fecha e ninguém abre” (Apoc 3.7).

O Senhor reserva para si o verdadeiro poder. Esse poder o Senhor o reserva para si, e não o transfere a nenhum outro, ficando ao lado ocioso, como espectador, enquanto os seus ministros trabalham. É Isaías que diz: “Porei sobre o seu ombro a chave da casa de David” (Is 22.22). E outra vez: “O governo está sobre os seus ombros” (Is 9.6). Ele não lança o governo sobre os ombros de outros homens, mas ainda conserva e usa o seu próprio poder, governando todas as coisas.

O poder do ofício e o ministerial. Entretanto, há outro poder, o do oficio, ou poder ministerial, limitado por aquele que usa do poder pleno. E este é mais semelhante a um ministério do que a um império. As chaves. Um senhor concede poder ao seu mordomo e para isso dá-lhes as chaves, com as quais ele introduz na casa ou dela exclui quem o seu senhor gostaria de introduzir ou excluir. Em virtude desse poder o ministro, pelo seu oficio, realiza aquilo que o Senhor ordenou que ele fizesse, e o Senhor confirma aquilo que ele faz e deseja que o que o seu servo fez seja considerado e reconhecido como se ele mesmo o tivesse feito. Indubitavelmente, é a isto que se referem estas sentenças evangélicas: “Dar-te-ei as chaves do reino dos céus: o que ligares na terra, terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra, terá sido desligado nos céus” (Mat 16.19). Ainda: “Se de alguns perdoardes os pecados, são-lhes perdoados; se lhos retiverdes, são retidos” (João 20.23). Mas, se o ministro não agir em todas as coisas como o Senhor lhe ordenou, mas transgredir os limites da fé, então o Senhor certamente invalida aquilo que ele fez. Eis por que o poder eclesiástico dos ministros da Igreja é aquela função pela qual eles de fato governam a Igreja de Deus, mas fazem todas as coisas na Igreja como o Senhor as ordenou em sua Palavra. Quando essas coisas são feitas, os fiéis as consideram como feitas pelo próprio Senhor. Quanto às chaves, delas já se fez acima uma menção.

O poder dos ministros é um e o mesmo em todos. Ora, o mesmo e igual poder ou função é concedido a todos os ministros na Igreja. Certamente, no princípio os bispos ou presbíteros governavam a Igreja em comum; nenhum homem se elevava acima de qualquer outro, ninguém usurpava maior poder ou autoridade sobre seus co-epíscopos. Lembrados das palavras do Senhor “Aquele que dirige seja como o que serve” (Luc 22.26) conservavam-se em humildade, e pelo serviço mútuo ajudavam-se no governo e na preservação da Igreja.

A ordem a ser preservada. Entretanto, por causa da preservação da ordem, algum dos ministros convocava reunião da assembléia, e perante ela propunha assuntos a serem apresentados, reunia as opiniões dos demais e, enfim, o quanto estava nele, providenciava para que não surgisse confusão. Assim procedeu São Pedro, segundo lemos nos Atos dos Apóstolos, o qual contudo não era, por essa razão, preferido pelos demais, nem revestido de maior autoridade que os outros. Mui acertadamente disse o Mártir São Cipriano, no seu De Simplicitate Clericorum: “Os outros apóstolos eram, seguramente, o que era Pedro, dotados de semelhante associação de honra e poder; mas, [seu] primado procede da unidade para que a Igreja seja manifesta como sendo uma”.

Como e quando um foi colocado diante dos outros. Também São Jerônimo, em seu Comentário à Epístola de Paulo a Tito, diz algo não muito diferente disto: “Antes que começasse a ligação a pessoas em religião, pela instigação do diabo, as igrejas eram governadas pelo conselho comum dos anciãos; mas, depois que cada um passou a pensar que aqueles que ele havia batizado eram seus e não de Cristo, decretou-se que um dos anciãos fosse escolhido e colocado sobre os demais, em quem recairia o cuidado de toda a Igreja, e que se removessem todas as sementes de cismas”. Contudo, São Jerônimo não recomenda este decreto como divino; pois ele logo acrescenta: “Assim como os anciãos sabem pelo costume da Igreja que se acham sujeitos ao que foi posto sobre eles, assim saibam os bispos, que se acham sobre os anciãos mais pelo costume do que pela verdade de uma disposição do Senhor, e que devem governar a Igreja em comum com eles”. Até aqui São Jerônimo. Por conseguinte, ninguém tem o direito de proibir o retorno à antiga constituição da Igreja de Deus, e recorrer a isso com apoio no costume humano.

Os deveres do ministro. São vários os deveres dos ministros, no entanto, em geral se restringem a dois, nos quais todos os outros estão incluídos: o ensino evangélico de Cristo e a legítima administração dos sacramentos. É dever dos ministros reunir a assembléia sagrada e nela expor a Palavra de Deus, e aplicar toda a doutrina à razão e ao uso da Igreja, de modo que o que for ensinado seja útil aos ouvintes e edifique os fiéis. É dever dos ministros, afirmo, ensinar os ignorantes e exortar; e estimular os indecisos ou ainda os que caminham lentamente à avançar no caminho do Senhor, consolar e confirmar os pusilânimes, e armá-los contra as multiformes tentações de Satanás; corrigir os que pecam; reconduzir ao caminho os transviados; levantar os caídos; convencer os contradizentes; expulsar do rebanho do Senhor os lobos; repreender, prudente e severamente os crimes e os criminosos; não serem coniventes nem se calarem perante o crime. Mas, além de tudo isso, é seu dever administrar os sacramentos, recomendar o uso justo deles e, pela sã doutrina, preparar todos para recebê-los; conservar também os fiéis numa santa unidade; e impedir os cismas, enfim catequizar os ignorantes, recomendar à Igreja as necessidades dos pobres, visitar, instruir e conservar no caminho da vida os enfermos e os afligidos por várias tentações. Além disso, devem cuidar das orações públicas ou das súplicas em ocasiões de necessidade, juntamente com o jejum, isto é, procurar uma santa abstinência; e cuidar o mais diligentemente possível de tudo o que diz respeito à tranqüilidade, à paz e à salvação das igrejas.

E para que o ministro possa realizar todas estas coisas da melhor maneira e mais facilmente, requer-se especialmente dele que tema a Deus, seja constante na oração, entregue-se à leitura sagrada e, em todas as coisas e em todas as ocasiões, seja vigilante, e pela pureza de vida deixe sua luz brilhar diante de todos os homens.

Disciplina. E, visto que a disciplina é absolutamente necessária na Igreja, e que a excomunhão foi outrora usada, entre os antigos, e havia, entre o povo de Deus julgamentos eclesiásticos, nos quais esta disciplina era exercida por homens sábios e piedosos, será também dever dos ministros regular essa disciplina para edificação, de acordo com as circunstâncias dos tempos, do estado público e com a necessidade. Todas as vezes que se deve observar a regra, tudo se deve fazer para edificação, decente e honestamente, sem tirania e divisão. Pois o apóstolo atesta que lhe foi outorgada pelo Senhor autoridade na Igreja “para edificação, e não para destruição” (II Co 10.8). E o Senhor mesmo proibiu arrancar o joio no campo do Senhor, porque haveria o perigo de ser arrancado o trigo juntamente com ele (Mat 13.29 ss).

Mesmo os maus ministros devem ser ouvidos. Ademais, detestamos energicamente o erro dos donatistas, que consideram a doutrina e a administração dos sacramentos eficazes ou ineficazes, segundo a vida boa ou má dos ministros. Porquanto sabemos que a voz de Cristo deve ser ouvida, mesmo dos lábios de maus ministros; porque o Senhor mesmo disse: “Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém, não os imiteis nas suas obras” (Mat 23.3). Sabemos que os sacramentos são santificados pela instituição e pela palavra de Cristo, e que são válidos para o fiel, embora administrados por ministros indignos. Sobre este assunto Santo Agostinho, o bem-aventurado servo de Deus, muitas vezes argumentou com base nas Escrituras, contra os donatistas.

Sínodos. Apesar disso, deve haver disciplina adequada entre os ministros. Nos Sínodos a doutrina e a vida dos ministros devem ser cuidadosamente examinadas. Os que pecam devem ser repreendidos pelos anciãos e reconduzidos ao caminho certo, se forem curáveis; e, se forem incuráveis, devem ser depostos, e, como lobos, expulsos do rebanho do Senhor pelos verdadeiros pastores. Se são falsos mestres, não podem ser de modo algum tolerados. Nem desaprovamos os concílios ecumênicos, se convocados segundo o exemplo dos apóstolos, para a salvação da Igreja e não para sua destruição.


O obreiro é digno do seu salário. Todos os ministros fiéis, como bons obreiros, são também dignos do seu salário e não pecam quando recebem estipêndios e todas as coisas necessárias a eles mesmos e suas famílias. O apóstolo mostra em I Co, cap. 9 e em I Tim, cap. 5, bem como em outras passagens, que tais coisas são, de direito, dadas pela Igreja e recebidas pelos ministros. Os anabaptistas, que condenam e difamam os ministros que vivem do seu ministério, são também refutados pelo ensino apostólico.
segunda-feira, 23 de setembro de 2013
O autor

Começaremos nosso estudo das cartas às sete igrejas da Ásia voltando nosso olhar para seu Autor. E que visão tremenda temos de Cristo! “Voltei-me para ver quem falava comigo” (Ap 1:10) e “quando o vi, caí a seus pés como morto” (Ap 1:17), confessa João. Nossas imagens de Jesus são construídas por quadros de artistas e por filmes que assistimos - que o representam como sendo frágil e quase afeminado - e não pelo que é apresentado nas Escrituras. Não admira que tenhamos tão pouca reverência por Sua bendita pessoa. Se apenas vislumbrasse a glória do Filho de Deus à direita do Pai, também cairíamos como mortos diante de Dele e diríamos, “ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!” (Is 6.5).

João descreve o Senhor como sendo “um semelhante a filho de homem” (Ap 1:13). Embora glorificado, Jesus guardava a semelhança da humanidade que assumiu na Encarnação, quando “o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade” (Jo 1.14). Porém, diferente das vestes humildes de então, agora estava vestido “com vestes talares e cingido, à altura do peito, com uma cinta de ouro” (Ap 1.13). O Senhor não está mais nu enquanto aos pés da cruz soldados disputam Sua túnica, mas vestido com roupas sacerdotais e reais. Não está no altar oferecendo sacrifício, o que fez na cruz de uma vez por todas, mas anda entre os cadeeiros de ouro (as igrejas), examinando se são dignos de estarem ali ou se deveria removê-los. É importante notar, desde agora e enquanto examinamos cada carta, que Jesus se dirige à igreja como Juiz “porque a ocasião de começar o juízo pela casa de Deus é chegada” (1Pe 4.17) .

“A sua cabeça e cabelos eram brancos como alva lã, como neve” (Ap 1.14), demonstra a pureza de Seu caráter, bem como Sua eternidade, enquanto que "os olhos, como chama de fogo” (Ap 1.14) apontam para Seu conhecimento perfeito, inclusive das intenções do coração do Seu povo. Desse modo, Seu julgamento da igreja é justo e fundamentado no pleno conhecimento que tem do coração e das obras dela. Corrobora isso “os pés, semelhantes ao bronze polido, como que refinado numa fornalha” (Ap 1:15), indicando perseverança e força no juízo divino.

Sendo o Apocalipse a “revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu” (Ap 1.1), é esperado ouvir Sua voz, “como voz de muitas águas” (Ap 1:15), o que nos faz lembrar do salmista dizendo “Ouve-se a voz do SENHOR sobre as águas; troveja o Deus da glória; o SENHOR está sobre as muitas águas. A voz do SENHOR é poderosa; a voz do SENHOR é cheia de majestade” (Sl 29.3–4). Acrescenta o profeta que “da boca saía-lhe uma afiada espada de dois gumes” (Ap 1:16), o que nos lembra a Escritura, “porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração” (Hb 4.12). O mundo não será subjugado com armas humanas, pois “sai da sua boca uma espada afiada, para com ela ferir as nações” (Ap 19.15), assim o Senhor dirá naquele dia “pela palavra da minha boca, os matei” (Os 6.5). Mas antes disso, o Senhor usará Sua Palavra em juízo contra a igreja infiel, pois “estas coisas diz aquele que tem a espada afiada de dois gumes” (Ap 2.12), “arrepende-te; e, se não, venho a ti sem demora e contra eles pelejarei com a espada da minha boca” (Ap 2.16). 

João termina a descrição do Cristo Exaltado dizendo que “o seu rosto brilhava como o sol na sua força” (Ap 1:16). João já havia contemplado a glória do Senhor na transfiguração, quando Jesus “foi transfigurado diante deles; o seu rosto resplandecia como o sol” (Mt 17.2). Porém, agora ele via Jesus em Sua glória imperial, pois então Jesus ainda não havia sido glorificado. Compreensível João ter desfalecido ante essa visão. Mas o Senhor põe sobre ele a mão direita e diz “Não temas” (Ap 1.17). O Senhor veio até ele para incumbi-lo de uma missão: “escreve, pois, as coisas que viste, e as que são, e as que hão de acontecer depois destas” (Ap 1:19).

As igrejas

As primeiras palavras do Senhor Ressuscitado para ele foram “o que vês escreve em livro e manda às sete igrejas: Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia” (Ap 1.11). Algumas considerações podem ser feitas aqui com relação às igrejas escolhidas. A primeira, é que cada igreja recebeu todas as cartas, na verdade, receberam o livro de Apocalipse inteiro. Pode-se imaginar o constrangimento de uma igreja sabendo que outras estariam lendo as repreensões do Senhor feita a elas. Apesar disso, as igrejas não foram comparadas entre si, cada uma delas é julgada de forma independente das outras. A segunda observação é por que sete igrejas? Sete é o número da perfeição e talvez o Senhor quisesse nos dizer que nelas as igrejas de todas as épocas estariam representadas. Finalmente, porque essas e não outras igrejas? Da lista, Paulo só menciona duas delas, Éfeso e Laodicéia. Havia mais igrejas no circuito postal dessas cidades, algumas mais importantes. Então, por que exatamente essas? Creio que jamais saberemos com certeza, talvez seja porque pelas suas características (virtudes e fracassos) elas são representativas das igrejas em todas as épocas.

As cartas

Seja qual for a razão da escolha dessas igrejas, as mensagens dirigidas a elas seguem uma estrutura semelhante. Todas elas (com poucas exceções) tem uma apresentação ou descrição do Cristo Exaltado baseada na visão que João teve, apresenta uma revelação do estado ou condição da igreja seguida do reconhecimento de virtudes e condenação de fracassos, com uma exortação ao arrependimento somada à uma declaração de juízo na falta dele, terminando com uma promessa de recompensa aos que perseverarem fiéis.

E antes de começarmos a análise das mensagens na ordem em que foram ditadas pelo Senhor, uma palavra sobre a interpretação das mesmas. As igrejas às quais as palavras foram dirigidas eram igrejas locais reais e a situação descrita representava a situação real dessas igrejas. Assim devem ser estudadas, antes de tudo. Porém, igrejas com problemas como os descritos nas mensagens sempre existiram, portanto, a mensagem é aplicável a igrejas de todas as épocas. Alguns, inclusive, enxergam uma ordem cronológica em relação a história da igreja, identificando cada carta com um período da igreja. Neste caso, as cartas seriam proféticas. De fato, algumas semelhanças são notáveis, porém a Escritura não autoriza essa interpretação e por isso não é bom força-la. Faremos referência à correlação de cada carta com o período da igreja correspondente a essa linha de interpretação, mas apenas como subsídio. Finalmente, as cartas tem uma aplicação pessoal, aos crentes individualmente, pois embora o Senhor se dirija à igreja, promete a indivíduos.

Seja como for, a recomendação que é feita e à qual devemos atentar é: “quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (Ap 2.7). 

Soli Deo Gloria
domingo, 22 de setembro de 2013
Deus usa ministros na edificação da Igreja. Deus sempre usou ministros para reunir ou estabelecer para si a Igreja, e para o governo e preservação da mesma; e ainda os usa e sempre os usará, enquanto a Igreja permanecer na terra. Portanto, a origem, a instituição e o ofício de ministros é uma ordenação muito antiga de Deus mesmo e não inovação de homens. Instituição e origem de ministros. É verdade que Deus poderia, pelo seu poder, sem qualquer meio, congregar para si mesmo uma Igreja de entre os homens; mas ele preferiu tratar com os homens pelo ministério de homens. Por isso os ministros devem ser considerados não como ministros apenas por si mesmos, mas como ministros de Deus, visto que por meio deles Deus realiza a salvação de homens.

O ministério não deve ser depreciado. Por essa razão, chamamos a atenção dos homens para que tomem cuidado para não atribuirmos o que diz respeito à nossa conversão e instrução ao poder secreto do Espírito Santo, fazendo pouco do ministério eclesiástico. Pois convém termos sempre em mente as palavras do apóstolo: “Como, porém, invocarão aquele em que não creram? e como crerão naquele de quem nada ouviram? e como ouvirão, se não há quem pregue? ... E assim, a fé vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo” (Rom 10.14, 17). E também o que o Senhor disse no Evangelho: “Em verdade, em verdade vos digo: Quem recebe aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou” (João 13.20). De igual modo, um homem da Macedônia, que apareceu numa visão a São Paulo, enquanto este se encontrava na Ásia, secretamente o admoestou dizendo: “Passa à Macedônia, e ajuda-nos” (At 16.9). E em outro lugar o mesmo apóstolo diz: “Porque de Deus somos cooperadores; lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós” (I Co 3.9).

Por outro lado, no entanto, devemos precaver-nos para não atribuirmos demasiado aos ministros e ao ministério; aqui também lembrando-nos das palavras de nosso Senhor no Evangelho: “Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer” (João 6.44), e as palavras do apóstolo: “Quem é Apolo? e quem é Paulo? Servos por meio de quem crestes, e isto conforme o Senhor concedeu a cada um ... Eu plantei, Apolo regou; mas o crescimento veio de Deus. De modo que nem o que planta é alguma cousa, nem o que rega, mas Deus que dá o crescimento” (I Co 3. 5, 7). Deus move os corações dos homens. Então, creiamos que Deus nos ensina pela sua palavra, externamente por meio dos seus ministros e internamente move os corações dos seus eleitos à fé pelo seu Espírito Santo; e que, portanto, devemos atribuir a Deus toda a glória de todo este benefício. Mas deste assunto já tratamos no primeiro capítulo desta Explanação.

Quem são os ministros e de que sorte são os que Deus deu ao mundo. E em verdade desde o princípio do mundo Deus usou os mais eminentes homens no mundo inteiro (ainda que muitos deles fossem simples na sabedoria terrena ou na filosofia, no entanto na verdadeira teologia eram excelentes), a saber, os patriarcas, com os quais ele falou freqüentemente pelos anjos. Pois os patriarcas eram os profetas e mestres dos seus dias, aos quais, por essa razão, quis Deus que vivessem por vários séculos, para que fossem, por assim dizer pais e luzes do mundo. Foram seguidos por Moisés e os profetas famosos pelo mundo inteiro.

Cristo o mestre. Depois destes o Pai celestial enviou o seu Filho unigênito, o mais perfeito mestre do mundo, em quem está escondida a sabedoria de Deus, a qual veio até nós através da mais santa, simples e perfeita de todas as doutrinas. Ele escolheu discípulos para si mesmo, aos quais fez apóstolos. Estes saíram por todo o mundo e em toda parte congregaram igrejas pela pregação do Evangelho, e depois ordenaram pastores ou mestres (doutores) em todas as igrejas do mundo, segundo o mandamento de Cristo; mediante seus sucessores ele ensinou e governou a Igreja até hoje. Portanto, como Deus deu ao seu povo antigo os patriarcas, juntamente com Moisés e os profetas, assim também ao seu povo do Novo Testamento ele enviou seu Filho unigênito e, com ele, os apóstolos e doutores da Igreja.

Ministros do Novo Testamento. Além disso, os ministros do novo povo são designados por diversos nomes. São chamados apóstolos, Profetas, evangelistas, bispos, anciãos, pastores e mestres (I Co 12.28; Ef 4.11). Os apóstolos. Os apóstolos não permaneciam num lugar determinado, mas por todo o mundo iam congregando diversas igrejas. Uma vez estas estabelecidos, deixou de haver apóstolos, e, em seu lugar, apareceram pastores, cada um em sua igreja. Profetas. Nos primeiros tempos eram videntes, conhecendo o futuro; mas também interpretavam as Escrituras. Tais homens são encontrados também hoje. Evangelistas. Os escritores da história evangélica eram chamados Evangelistas; mas eram também arautos do Evangelho de Cristo; como o apóstolo São Paulo ordena a Timóteo: “Faze o trabalho de evangelista” (II Tim 4.5). Bispos. Bispos são os supervisores e vigias da Igreja, que administram o alimento e outras necessidades da vida da Igreja. Presbíteros. Os presbíteros são os anciãos e, por assim dizer, os senadores e pais da Igreja, governando-a com sadio conselho. Pastores. Os pastores não só guardam o rebanho do Senhor, como também providenciam as coisas necessárias a ele. Mestres. Os mestres instruem e ensinam a verdadeira fé e piedade. Portanto, os ministros da Igreja podem, agora, ser chamados bispos, anciãos, pastores e mestres.

Ordens dos papistas. Com o passar o tempo, muitas outras designações de ministros na Igreja foram introduzidas na Igreja de Deus. Alguns foram ordenados patriarcas, outros arcebispos, outros sufragâneos; também metropolitanos, arquidiáconos, diáconos, subdiáconos, acólitos, exorcismas, cantores, porteiros e não sei quantos outros, como cardeais, reitores e priores; abades maiores e menores; ordens mais elevadas e inferiores. Não estamos preocupados, porém, acerca de todas estas, de como foram uma vez e são agora. Basta-nos a doutrina apostólica no que concerne aos ministros.

A respeito dos monges. Como sabemos com certeza que os monges e as ordens, ou seitas de monges, não são instituídas nem por Cristo, nem pelos apóstolos, ensinamos que elas nada valem para a Igreja de Deus; antes são perniciosas. Pois, embora anteriormente fossem toleráveis - quando eram solitários, ganhando a vida com suas próprias mãos, e não eram carga para ninguém e, como os leigos, eram por toda parte obedientes aos pastores das igrejas - agora, porém, o mundo todo vê e sabe a que são semelhantes. Eles formulam não sei que votos; mas levam vida totalmente contrária aos seus votos, de modo que os melhores deles merecem ser incluídos entre aqueles de quem o apóstolo fala: “Estamos informados de que entre vós há pessoas que andam desordenadamente, não trabalhando” etc. (II Tes 3.11 ). Portanto, não temos tais pessoas em nossas igrejas, nem ensinamos que devem existir nas igrejas de Cristo.

Os ministros devem ser chamados e eleitos. Ninguém deve usurpar a honra do ministério eclesiástico; isto é, apoderar-se dele por suborno ou quaisquer enganos, ou por sua própria escolha. Que os ministros da Igreja sejam chamados e eleitos por eleição legal e eclesiástica; isto é, que sejam eleitos escrupulosamente pela Igreja ou por aqueles que dela receberam delegação para tal fim, na devida ordem, sem qualquer tumulto, divisões ou rivalidade. Não se eleja qualquer um, mas homens idôneos, que se distingam por suficiente cultura sagrada, piedosa eloqüência, sabedoria simples, e por fim, pela moderação e reputação honrada, segundo a regra apostólica fixada pelo apóstolo em I Tim, cap. 3, e Tit, cap. 1.

Ordenação. E os que foram eleitos sejam ordenados pelos anciãos com orações públicas e imposição das mãos. Aqui condenamos todos quantos concorrem por conta própria, não sendo nem escolhidos, nem enviados, nem ordenados (Jer. cap. 23). Condenamos os ministros ineptos e os desprovidos dos dons necessários a um pastor.

Ao mesmo tempo, reconhecemos que a inocente simplicidade de certos pastores na Igreja Antiga por vezes aproveitou mais à Igreja do que a erudição multiforme, refinada e elegante mas demasiado infatuada de outros. Por esse motivo não rejeitamos, nem mesmo hoje, a simplicidade honesta de alguns, que não é, porém, de modo algum ignorante.

O sacerdócio de todos os crentes. Sem dúvida, os apóstolos de Cristo designam todos os que crêem em Cristo como “sacerdotes”, não por causa de qualquer ofício, mas porque, por Cristo, todos os fiéis, feitos reis e sacerdotes, podemos oferecer sacrifícios espirituais a Deus (Êx 19.6; I Ped 2.9; Apoc 1.6). Portanto, o sacerdócio e o ministério são bem diferentes um do outro. O sacerdócio, como acabamos de dizer, é comum a todos os cristãos; o mesmo não acontece com o ministério. Nem abolimos o ministério da Igreja pelo fato de termos repudiado o sacerdócio papístico da Igreja de Cristo.

Sacerdotes e sacerdócio. Sem dúvida nenhuma, na nova aliança de Cristo não existe mais essa forma de sacerdócio como existia entre o povo antigo; o qual incluía unção externa, roupagens santas e inúmeras cerimônias que eram tipos de Cristo, que aboliu tudo isso pela sua vinda e cumprimento desses tipos. Mas ele mesmo permanece o único sacerdote para sempre e para não subtrairmos qualquer coisa dele, não chamamos sacerdote a nenhum dos ministros. Pois o próprio Senhor nosso não nomeou nenhum sacerdote na Igreja do Novo Testamento, que, tendo recebido autoridade do sufragâneo, ofereçam sacrifício diariamente, isto é, a própria carne e sangue do Senhor, pelos vivos e mortos, mas ministros que ensinem e administrem os sacramentos.
sábado, 21 de setembro de 2013
Duas passagens da epístola aos Hebreus ressaltam para nossa compreensão, relacionadas ao desafio à doutrina da preservação dos santos, ensinada em João 10.28. Tais passagens são Hebreus 6.4-6 e 10.26-31. Ambas ensinam que o crente professo pode voltar-se contra o Senhor Jesus depois de tê-lo recebido como Salvador. Mas a verdadeira questão em tela é se uma ou outra dessas passagens tem em vista o crente regenerado.

Hebreus 6.4-6 foi bem traduzido pela NVI: "Ora, para aqueles que uma vez foram iluminados [hapax phōtisthentas], provaram o dom celestial, tornaram-se participantes [metochous genētherttas] do Espírito Santo, experimentaram a bondade da palavra de Deus e os poderes da era que há de vir, se caírem, ser recuperados pelo arrependimento, pois para si mesmos estão crucificando de novo o Filho de Deus, sujeitando-o à desonra pública". Vamos examinar ponto a ponto a descrição que se faz do apóstata: 

1. Ele foi iluminado por uma clara apresentação do evangelho e pelo convite para que se arrependa e creia. Aparentemente essa pessoa fez profissão de fé e recebeu Cristo como seu Salvador.

2. A pessoa provou o dom celestial (dōrea, que não é a mesma coisa de charisma, "dom espiritual"); isto é, ela tomou parte nas atividades da igreja, na comunhão alegre dos demais cristãos no culto e na obra de Deus, e chegou a ver uma reação perante seu testemunho e apelo nas reuniões públicas.

3. A pessoa provou a bondade da Palavra de Deus. Ou seja, ela chegou à compreensão clara da mensagem bíblica e mentalmente a aprovou, tendo apreciado a apresentação fiel e ardorosa da parte dos pregadores.

4. A pessoa chegou a provar os poderes da era vindoura — da mesma forma que Judas os experimentou, quando ele voltou com os outros onze, exultando com exuberância de que no decurso de sua campanha evangelística, divididos em duplas, até os demônios se lhes sujeitavam, quando pregavam o Senhor Jesus (Lc 10.17). É evidente que ele estava tão envolvido naquele esforço que na véspera de sua traição, no jardim do Getsêmani, nenhum de seus colegas suspeitava do ato traiçoeiro que Judas tinha em mente durante a refeição pascal. (Sabemos disso porque os apóstolos perguntaram uns aos outros, ao redor da mesa, "Com certeza não sou eu!" [Mc 14.19]. Nem souberam naquele dia a quem Jesus se referia como o traidor.) 

Veja-se que aquelas três qualidades estavam presentes em Judas. Ele havia sido iluminado, experimentado o dom celestial e provado a bondade da Palavra de Deus, ao sentar-se durante três anos ouvindo o ensino do Senhor Jesus. Enquanto havia participado da pregação do Evangelho e da expulsão de demônios, também possuía a ajuda do Espírito Santo. Todavia, nada disso implica que ele tenha sido habitado pela terceira Pessoa da Trindade; seu corpo não havia sido tomado pelo Espírito para ser o templo santo de Deus. Jamais! Cristo podia ler seu coração e ver a hipocrisia e a traição lá dentro — pois o Senhor o indicou com clareza durante a Última Ceia. Na oração sacerdotal de João 17, Jesus falou de Judas como "aquele que estava destinado à perdição" (v. 12). Nenhum esforço extraordinário da imaginação poderia fazer dele, em tempo algum, um crente nascido de novo, pouco importando quão convincente tenha sido seu desempenho perante seus colegas apóstolos. No entanto, as quatro qualidades tidas como próprias de um apóstata estavam presentes em Judas.

Fica bem claro que o tempo todo Judas esperava obter vantagens pessoais da parte de Jesus; talvez desejasse uma posição honorífica no reino vindouro de Cristo (que ele julgava ser primordialmente político e de natureza terrena). Ele nunca aceitara com seriedade Jesus como Senhor, em seu coração; jamais depositou seu corpo no altar da devoção sincera à vontade e à glória de Deus. Judas poderia ter professado essa entrega, mas jamais a levou a sério. Quando Jesus deixou bem claro que não tencionava usar seus poderes sobrenaturais a fim de obter vantagens políticas, Judas tomou a decisão de traí-lo e entregá-lo às autoridades do templo em troca de algum dinheiro. Essa iniciativa deixa bem claro que ele pretendia usar Cristo para atingir seus interesses egoístas; ele não queria entregar-se e ser útil a Jesus para seu serviço e glória.

Cedo ou tarde chega a época da provação na carreira de quem aceita Jesus como Salvador — o Senhor para quem ele quer viver, por quem está pronto a morrer — mas, mediante tal provação, sua "conversão" espúria se tornará bem patente. O verdadeiro crente, nascido de novo, do tipo que jamais é arrancado das mãos do Mestre, é aquele que passou por aquela mudança interior, transformação do coração, que o faz centralizar-se em Cristo, em vez de em si mesmo (cf. 2 Co 5.14-17). A morte da pessoa para o mundo e para o seu eu, a entrega a Jesus como Senhor, que dá acesso ao Espírito Santo, e faz com que o Espírito tome posse do convertido de modo completo e total, é uma regeneração genuína, permanente. Ainda que esse crente possa em certa ocasião voltar atrás, durante algum tempo, e experimentar de novo o peso antigo da escravidão e vergonha, ele jamais terá permissão para permanecer no estado de rebelião e derrota. O Espírito Santo não o deixará a sós, mas por esse ou aquele meio vai atraí-lo de volta ao arrependimento renovado, à fé e à entrega total.

A segunda passagem de Hebreus que devemos estudar é 10.26, 27: "Se continuarmos a pecar deliberadamente [hekousiōs também pode significar 'de boa vontade'] depois que recebermos o conhecimento da verdade, já não resta sacrifício pelos pecados, mas tão-somente uma terrível expectativa do juízo e de fogo intenso que consumirá os inimigos de Deus". Aqui há de novo uma recepção anterior do conhecimento da verdade como a temos em Jesus (semelhante ao "iluminados" de 6.4) e uma compreensão integral do sentido da cruz. Mas infelizmente é possível tomar posse do plano da salvação como um conceito e comunicá-lo claramente a outros, como questão de ensino, e apesar disso nunca entregar-se realmente a Jesus. A Bíblia define o ato de crer verdadeiramente como aceitar a Cristo — não simplesmente o ensino de Jesus como filosofia ou teoria — como Senhor e Salvador: "... aos que o receberam, aos que creram em seu nome, deu-lhes o direito..." (Jo 1.12).

O crente que recebe Jesus como Senhor com toda convicção e verdade nunca voltará com sinceridade e de boa vontade à prática do pecado, pois jamais "pisou aos pés o Filho de Deus" (Hb 10.29); nunca considerará seu sangue derramado como impuro ou profano (koinon), e jamais insultará galhofeiramente o Espírito Santo. A pessoa que consegue admitir em si mesma esse tipo de impiedade e desprezo para com seu Salvador divino, com toda certeza nunca entregou seu coração a Ele. À semelhança de Judas, pode ter pensado que apenas "tentaria Jesus" e ver até que ponto gosta do Senhor, e se poderá obter dele as vantagens e bênçãos que almeja para si mesmo, para sua própria satisfação. Visto que tal crente jamais levou a sério as afirmações de Cristo, pois nunca admitiu o senhorio dele em sua vida, tal cristão não passou de uma falsificação espiritual, desde o início. Deus jamais se contenta com falsificações. Ele só aceita o crente real, genuíno. Deus não pode deixar-se enganar, nem mesmo pela demonstração mais piedosa. Ele consegue ler nossos corações.

Archer, G.
In: Enciclopédia de temas bíblicos.
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
O que se constata, cada vez mais, é que o fenômeno pseudo-pentecostal tem concorrido para uma maior aproximação entre os pentecostais (já tidos como históricos, por sua antigüidade e mobilidade social e cultural) e as igrejas históricas. De um lado, os pentecostais redescobrem o valor da história, de uma confessionalidade e de uma teologia sólida; do outro, os históricos vão flexibilizando (ou ampliando) a sua pneumatologia, reconhecendo a contemporaneidade dos dons do Espírito Santo. O fosso entre pentecostais e pseudo-pentecostais tende a aumentar, não só pela aproximação entre pentecostais e históricos, mas também pela crescente adesão dos pseudo-pentecostais a ensinos e práticas sincréticas, com o catolicismo romano popular e os cultos afro-ameríndios. Quando estudantes de teologia assembleianos, batistas nacionais ou presbiterianos renovados aprendem com teólogos anglicanos (John Stott, J.I. Packer, Michael Greene, Alister McGrath, N.T. Wright), e anglicanos, luteranos ou presbiterianos usam de um louvor mais exuberante e oram por cura e libertação, na expressão de Gramsci, um novo “bloco histórico” vai se formando (retardado pelo extremo fracionamento entre ambos os segmentos), do qual, é claro, não faz parte o pseudo-pentecostalismo. Esse “bloco histórico” em formação, para se consolidar, não apenas deve se conhecer mais mutuamente, somando conceitos e subtraindo preconceitos, mas também responder aos desafios de um pluralismo que inclui a diversidade do catolicismo romano, o pseudo-pentecostalismo, o esoterismo, os sem-religião e um agressivo secularismo, emoldurado pelo relativismo pós-moderno. Isso passa, necessariamente, pelo aprender com a história da igreja -- durante, depois e “antes” da Reforma -- e pela superação de uma iconoclastia que, equivocadamente, equipara o artístico com o idolátrico.

Bp. Robinson Cavalcanti
In: Pseudo-pentecostais: nem evangélicos, nem protestantes (clique para ler a íntegra do artigo)
terça-feira, 17 de setembro de 2013
Esta semana, meu marido e eu celebraremos nosso 16o aniversário de casamento. Assim, como todo mundo faz na época de seu aniversário, ando pensando sobre as pessoas que éramos quando dissemos “Sim”. Eu tinha apenas 21 anos, recém-saída da faculdade. É engraçado porque eu achava que estava tão “apaixonada” – tanto que decidi entregar o resto da minha vida a esse homem a quem eu pensava conhecer muito bem.

Embora eu conhecesse Matt naquela perfeita tarde de junho, havia muito mais a aprender sobre ele. Durante o últimos 16 anos de experiências conjuntas no casamento, descobri muito mais sobre meu marido como provedor, pai, amigo e amante. Quando eu fiz aqueles votos, “na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza”, eu estava comprometendo minha vida ao que cria ser verdade sobre o homem com quem me casava. Meu conhecimento era baseado no ano e meio em que estivemos em um relacionamento. Agora que tenho uma filha fazendo 14 anos em breve, percebo que era apenas 7 anos mais velha que ela quando fiz essas avaliações de caráter sobre seu pai. Eu estou muito grata porque Matt ultrapassou o que eu sabia ser verdade sobre ele há 16 anos.

Eu amo aprender sobre meu marido, nos períodos bons e nos maus. Grande parte de um relacionamento é aprender sobre o outro, conhecer o outro intimamente. E eu acho que esse é um anseio profundo que todos temos – sermos realmente conhecidos. Embora a pessoa com quem me casei seja tão maravilhosa, às vezes, eu me descubro solitária porque ele nunca poderá conhecer-me realmente da forma como anseio ser conhecida.  Mas eu sei que há uma razão para isso. Isso está reservado para outro marido. Nosso casamento não foi consumado ainda, mas, junto com todos aqueles que ele chamou, justificou e está santificando para glorificação, eu sou a noiva de Cristo. Ele é o único que me conhece da forma como anseio ser conhecida.

E, como sua noiva, a igreja não se satisfaz com o que aprendeu sobre seu noivo no dia em que noivou. É somente o começo. Nós anelamos aprender mais sobre Aquele com quem estamos em aliança pela eternidade. É uma expressão de nosso amor. É nosso prazer. Na doença e na saúde, pobreza e abundância, nós encontramos um noivo fiel. Ele realmente ensina-nos sobre amor enquanto aprendemos mais sobre ele. E quanto mais descobrimos sobre ele, mais nosso amor cresce.

Teologia é o estudo de Deus. É conhecer quem Deus é e o que ele fez. Deus sabe que é muito importante para nós aprender sobre ele. Assim, ele nos deu sua Palavra escrita. É um livro bastante robusto! Ele também designou pregadores e levantou mestres para transmitir sua Palavra e ajudar-nos a estudá-la mais profundamente. A cada Dia da Ressurreição, sua igreja reúne-se para uma cerimônia de renovação da aliança, onde o futuro da nossa adoração em glória desponta nesta era presente. Nós somos abençoados e renovados por sua Palavra e sacramentos. Sua Palavra realmente tem o poder de criar o que proclama. Nosso noivo está amavelmente transformando-nos em sua noiva perfeita. E em sua encarnação, vida de obediência, morte, ressurreição e ascensão à destra do Pai, ele cumpriu tudo em favor de sua noiva para que isso aconteça.

A noiva de Cristo ama teologia porque ela ama Deus. Nós amamos Deus porque ele primeiro nos amou. Como poderíamos não querer aprender mais sobre tão grandioso amante?

Traduzido por Josaías Jr | iPródigo.com | Original aqui

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Aimee Byrd
domingo, 15 de setembro de 2013
Marcas ou sinais da verdadeira Igreja. Ademais, visto que não reconhecemos nenhum outro chefe da Igreja a não ser Cristo, de igual modo não reconhecemos como a verdadeira Igreja qualquer Igreja que se vangloria de o ser; ensinamos, no entanto, que a verdadeira Igreja é aquela em que se encontram as marcas ou sinais da verdadeira Igreja, principalmente a legítima e sincera pregação da palavra de Deus como nos foi deixada nos escritos dos profetas e apóstolos, que nos conduzem todos nós a Cristo, que no Evangelho disse: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna... De modo nenhum seguirão o estranho, antes fugirão dele porque não conhecem a voz dos estranhos” (João 10.5, 27, 28).

E aqueles que são assim na Igreja de Deus têm uma fé e um espírito; e por isso adoram o único Deus e só a ele cultuam em espírito e verdade, só a ele amando de todo o coração e de todas as suas forças, só a ele orando por meio de Jesus Cristo, o único Mediador e Intercessor; e não buscam nenhuma justiça e vida fora de Cristo e da fé nele. Pelo fato de reconhecerem a Cristo como o único chefe e fundamento de sua Igreja, apoiando-se nele, renovam-se diariamente pelo arrependimento e, com paciência, carregam a cruz imposta a eles. Além disso, congregados juntos com todos os membros de Cristo por um amor não fingido, revelam que são discípulos de Cristo perseverando no vínculo da paz e da santa unidade. Ao mesmo tempo participam dos sacramentos instituídos por Cristo e a nós entregues pelos seus apóstolos, não os usando de nenhuma outra maneira a não ser como os receberam do próprio Senhor. Aquela palavra do apóstolo São Paulo é bem conhecida de todos: “Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei” (I Co 11.23 ss). Por causa disso, condenamos como alienadas da verdadeira Igreja de Cristo todas aquelas igrejas que não são como ouvimos que devem ser, a despeito do muito que se jactam de uma sucessão de bispos, de unidade e de antiguidade. Além do mais, temos a advertência dos apóstolos de Cristo, para que fujamos da idolatria e de Babilônia (I Co 10.14; I João 5.21), e não tenhamos parte com ela se não queremos ser participantes das pragas de Deus (Apoc 18.4; II Co 6.17).

Fora da Igreja de Deus não há salvação. Consideramos a comunhão com a verdadeira Igreja de Cristo coisa tão elevada que negamos que possa viver perante Deus aqueles que não estiverem em comunhão com a verdadeira Igreja de Deus, mas dela se separam. Pois, como não havia salvação fora da arca de Noé, quando o mundo perecia no dilúvio, igualmente cremos que não há salvação certa e segura fora de Cristo, que se oferece para o bem dos eleitos na Igreja; e por isso ensinamos que os que querem viver não podem separar-se da Igreja de Cristo.

A Igreja não está limitada aos seus sinais. Entretanto, pelos sinais acima mencionados, não restringimos a Igreja ao ponto de ensinarmos que estão fora dela todos aqueles que ou não participam dos sacramentos, pelo menos não voluntariamente ou por desprezo, mas antes, forçados pela necessidade, involuntariamente se abstêm deles ou deles são privados, ou em quem a fé algumas vezes falha, embora não seja inteiramente extinta e não cesse de todo; ou em quem se encontram as imperfeições e erros devidos à fraqueza. Sabemos que Deus teve alguns amigos no mundo fora da comunidade de Israel. Sabemos do que aconteceu ao povo de Deus no cativeiro da Babilônia, onde foram privados dos seus sacrifícios por setenta anos. Sabemos o que aconteceu a São Pedro, que negou o Mestre, e o que costuma acontecer diariamente aos eleitos de Deus e às pessoas fiéis que se desviam e são fracas. Sabemos, mais, que tipo de igrejas eram as existentes na Galácia e em Corinto nos dias dos apóstolos, nas quais o apóstolo encontrou muitos e sérios pecados; apesar disso ele as chama santas igrejas de Cristo (I Co 1.2; Gal 1.2).

A Igreja às vezes parece estar extinta. Sim, muitas vezes acontece que Deus, em seu justo juízo, permite que a verdade da sua Palavra, a fé católica e o culto verdadeiro de Deus sejam de tal forma obscurecidos e deformados, que a Igreja parece quase extinta e não mais existir, como vemos ter acontecido nos dias de Elias (I Reis 19.10, 14), e em outras ocasiões. Não obstante, Deus tem, neste mundo e nestas trevas, os seus verdadeiros adoradores, que não são poucos, chegando mesmo a sete mil e mais (I Reis 19.18, Apoc 7.4, 9). Pois o apóstolo exclama: “O firme fundamento de Deus permanece, tendo este selo, ‘O Senhor conhece os que lhe pertencem’”, etc. (II Tim 2.19). Vem daí que pode a Igreja de Deus ser designada invisível; não que os homens dos quais ela é formada sejam invisíveis, mas porque, estando oculta de nossos olhos e sendo conhecida só de Deus, ela às vezes secretamente foge ao juízo humano.

Nem todos os que estão na Igreja são da Igreja. Por outro lado, nem todos os que são contados no número da Igreja são santos ou membros vivos e verdadeiros da Igreja. Pois há muitos hipócritas que externamente ouvem a palavra de Deus e publicamente recebem os sacramentos, e parecem invocar a Deus somente por meio de Cristo, confessar que Cristo é a sua única justiça, e adorar a Deus e exercer os deveres de caridade e por algum tempo suportar com paciência as desgraças. E, não obstante, interiormente, estão completamente destituídos da verdadeira iluminação do Espírito, de fé e de sinceridade de coração, e de perseverança até o fim. Mas finalmente o caráter destes homens, em sua maior parte, será manifestado. O apóstolo São João diz: “Eles saíram de nosso meio, mas não eram dos nossos; porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido conosco” (I João 2.19). Todavia, conquanto simulem piedade, não são da Igreja, ainda que sejam considerados estarem na Igreja, exatamente como os traidores numa república estão incluídos no número de seus cidadãos, antes que sejam descobertos; e, como o joio e a palha se encontram no trigo, e como inchaços e tumores se acham no corpo sadio, quando ao contrário são doenças e deformidades e não genuínos membros do corpo. E assim a Igreja de Deus é muito adequadamente comparada a uma rede que retira peixes de todas as espécies, e a um campo no qual se encontram joio e trigo (Mat 13.24 ss, 47 ss).

Não devemos julgar irrefletida e prematuramente. Conseqüentemente, devemos ser muito cuidadosos, não julgando antes da hora, nem tentando excluir e rejeitar ou separar aqueles aos quais o Senhor não quer excluídos nem rejeitados, e nem aqueles que não podemos eliminar sem prejuízo para a Igreja. Por outro lado, devemos estar vigilantes para que, enquanto os piedosos ressonam, os ímpios não ganhem terreno e causem mal à Igreja.

A unidade da Igreja não consiste em ritos externos. Além disso, diligentemente ensinamos que se deve tomar grande cuidado naquilo em que consistem de modo especial a verdade e a unidade da Igreja, para não provocarmos nem alimentarmos cismas na Igreja, irrefletidamente. A unidade não consiste em cerimônias e ritos externos, mas antes na verdade e unidade da fé católica. A fé católica não nos é transmitida pelas leis humanas, mas pelas Santas Escrituras, das quais é um resumo o Credo Apostólico. E, assim, lemos nos escritores antigos que havia grande diversidade de cerimônias, mas que eram livres e ninguém jamais pensava que a unidade da Igreja era, desse modo, dissolvida. Assim, ensinamos que a verdadeira harmonia da Igreja consiste em doutrinas e na verdadeira e unânime pregação do Evangelho de Cristo, nos ritos que foram expressamente transmitidos pelo Senhor. E aqui insistimos na palavra do apóstolo: “Todos, pois, que somos perfeitos, tenhamos este sentimento; e, se porventura pensais doutro modo, também isto Deus vos esclarecerá. Todavia, andemos de acordo com o que já alcançamos” (Fil 3.11 ss).
sábado, 14 de setembro de 2013
Calvinismo é o nome que popularmente se dá à formulação teológica que se preocupa por enfatizar a glória de Deus e sua soberania sobre os assuntos humanos em toda a sistemática doutrinária. Recebe este nome por causa do reformador francês João Calvino, o primeiro grande sistematizador da teologia cristã protestante. O que muitos ignoram, no entanto, é que Calvino não foi o “inventor” do calvinismo. A doutrina que envolve a soberania de Deus sobre os assuntos humanos, a predestinação do homem para a salvação e, conseqüentemente, para a condenação, a total pecaminosidade do homem não-regenerado que o impede de dar qualquer passo em direção a Deus, a negação do livre-arbítrio como fator soteriológico, tudo isso já era pregado por Lutero e os outros reformadores. Esta doutrina também era ensinada pelos pais primitivos, e muito especialmente nos escritos de Agostinho, bispo de Hipona, depois canonizado pela igreja católica. Enfim, a doutrina calvinista sempre existiu, embora com outros nomes, porque ela é bíblica e encontra suas bases mais sólidas nas sublimes afirmações de Jesus e do apóstolo Paulo.

Tal é a superioridade e o bibliocentrismo da teologia calvinista, que o grande pregador Charles Spurgeon chegou a afirmar que “calvinismo é apenas outro nome para evangelho”. De fato, nenhuma teologia posterior a ela conseguiu superá-la no que diz respeito à fidelidade doutrinária. Não é por casualidade que ela era crida e ensinada por grandes mentes do protestantismo, tais como Jonathan Edwards, Charles Haddon Spurgeon, e por célebres missionários como William Carey e Hudson Taylor. Ao longo dos anos a doutrina calvinista foi questionada, primeiro por James Armínio e seus discípulos, e ainda hoje é atacada por muitos, entre os quais se encontram principalmente os arminianos, os teólogos relacionais e liberais, mas jamais houve um momento da história eclesiástica esta doutrina deixou de ser crida e pregada.

Ainda me lembro do primeiro debate que tive com um calvinista. Naquela época eu tinha recém saído de um seminário pentecostal, onde havia sido bem instruído no arminianismo. Lá tinham me ensinado (sutilmente) que o calvinismo é uma grave heresia e uma desculpa para viver uma vida sem santidade ou temor. Lembro daqueles acalorados debates, dos quais eu sempre saia cheio de dúvidas (Dúvidas que pouco a pouco foram se convertendo em certezas opostas àquelas que eu tinha sustentado naqueles primeiros anos). Jamais me esquecerei do dia em que este amigo e debatedor me emprestou um exemplar em espanhol da “Carta de João Calvino ao Rei da França: Instituição da Igreja Cristã” . Que experiência maravilhosa ler aquele livro! Somente um livro despertou em mim mais prazer e curiosidade que aquele; a Bíblia Sagrada, no qual aquele volume estava respaldado.

Após isso voltei ao Brasil. Na viagem, eu lutava contra aquela “nova crença” que estava querendo brotar no meu coração. Ao chegar, me matriculei no curso de mestrado em teologia (livre). Para obter o título, escrevi uma tese de 200 páginas sobre aquilo que os filósofos chamam de “o problema do mal”. Em resumo, a tese se baseava no livre-arbítrio do homem, e era uma negação disfarçada do calvinismo, a grave heresia da qual me apaixonei na minha primeira estadia no país dos Incas. O problema é que quanto mais eu buscava pelo livre arbítrio, mas eu encontrava o designo de Deus. Terminei a dissertação, me graduei, mas o coração estava apertado, pois era a primeira vez que eu defendia uma crença incompatível com as minhas convicções.

Foi então que me falaram de um livro fantástico: “Eleitos, mas Livres”, do renomado apologista cristão Norman Geisler. Aparentemente, era tudo o que eu precisava naquele momento: Um argumento que conciliasse a liberdade humana absoluta e a eleição de Deus, cujo proponente era um dos maiores apologetas da atualidade. Mas a leitura deste livro foi um placebo, e seu efeito durou apenas alguns meses. Nessa época eu ensinava teologia sistemática no seminário da minha igreja, e pela primeira vez ensinei o calvinismo e o arminianismo ao mesmo tempo, incluindo no final da exposição aquilo que eu chamava de “cosmovisao conciliadora”. Que fiasco! Mais fácil me teria sido conciliar água e óleo.

Durante a leitura de “Eleitos, mas livres”, tive grande curiosidade de conhecer mais sobre o R.C. Sproul e o tal livro “Eleitos de Deus”, o qual Norman Geisler aparentemente refutava. Na verdade, a leitura daquele livro se impunha como uma questão de justiça: Eu precisava dar uma oportunidade também ao R.C. e o seu livro antes de tirar minhas conclusões. Até então, tudo o que eu tinha deste autor era um pequeno livro chamado “Filosofia para Iniciantes”, que ocupava um lugar secundário na minha parca biblioteca. Pois bem; bastou iniciar a leitura para o meu pesadelo recomeçar, porém agora o efeito que esta crença teria sobre mim seria decisivo. Acabei a leitura perplexo do “biblismo” do autor, o qual diferente de Norman Geisler, não apelava todo tempo para silogismos da razão humana, mas sempre recorria ao texto bíblico para elucidar suas questões. Ao terminar a leitura, eu estava “quase calvinista”.

Neste ponto, decidi trilhar meu próprio caminho. Separei um tempo para estudar sistematicamente a carta de Paulo aos Romanos, o maior tratado soteriológico já escrito. Decidi esvaziar ao máximo dos meus pressupostos, a fim de encarar o texto bíblico e as implicações a que ele me levasse. Em oração, passeei pelos primeiros capítulos e fiquei assombrado diante da total incapacidade humana. A frase “não há quem busque a Deus” ficou ecoando no meu coração durante muitos dias. Ali eu me vi morto em pecado, incapaz de buscar ao meu Senhor por mim mesmo, ou pelo meu livre arbítrio. Que terrível destruição causou o pecado! Os capítulos seguintes me conscientizaram da oferta gratuita de Deus, a salvação, a qual – agora eu entendia – era um bem eterno e irrevogável. Segui em meu estudo por alguns dias, e encontrei finalmente a visão da soberania de Deus, tanto sobre o destino das nações, quanto sobre os indivíduos. Um oleiro que tem absoluto poder sobre os vasos, inclusive para fazer uns para honra e exercer sobre eles misericórdia justa (estribada na justiça de Cristo); como para fazer outros para desonra e ira, e demonstrar sobre eles sua justiça penalizadora (estribada na sua santidade). Finalmente, entendi que “não depende de quem corre, mas de Deus que tem misericórdia”.

Após esta leitura fiz uma busca por toda bíblia, a qual sempre me dirigia a esta mesma verdade: A de que o homem nada pode fazer pela sua salvação, de que Deus os chama como um ato soberano e glorioso e de que o “livre-arbítrio” está dominado por uma perversa natureza que é incapaz de exercer impulso soteriológico positivo. Permanece, no entanto, alguns questionamentos de outrora. Na verdade, depois de algum tempo me dei conta de que algumas questões realmente não possuem explicação lógica. Entendi que o paradoxo é essencial ao cristianismo, uma vez que o cristianismo é um ato de fé. Mas não busco justificar a Deus por punir o pecado com um inferno eterno, tal como muitos pretensos apologistas fazem. Apenas repito ao meu coração que as ações de Deus são justas (como de fato, são) e toco o meu barco. Reconheço que o calvinismo, à principio, é uma doutrina amarga, principalmente para aqueles que foram instruídos no “melhor” do arminianismo e do pentecostalismo. No entanto, não me convém modificar uma doutrina bíblica apenas pelo sabor que ela proporciona ao meu paladar. Nem os meus gostos, nem meus preconceitos ou mesmo a minha justiça humana pode definir uma doutrina bíblica. “À lei e ao testemunho!”. Sola Scriptura!

Reconheço que meu calvinismo carece de mais robustez. No entanto, o conhecimento que hoje tenho dele não traz mais nenhum sabor amargo. Graças ao “calvinismo” (leia-se: sistematização do evangelho de Jesus), pude finalmente descansar na graça de Deus. Não fiquei mais pecador por isso. Não evangelizo menos depois que entendi que a salvação está ligada a uma eleição feita na eternidade. Não oro menos depois que descobri que “estou salvo para sempre”. Antes, a segurança da salvação me faz imensamente grato, e é esta gratidão e amor que me oferecem combustível para uma vida de temor e piedade. Desde que atribuí toda a glória a Deus por minha salvação, não confiando mais na “obra do meu arbítrio”, passei a ser mais humilde, pois entendi que tudo, absolutamente tudo de bom, é um presente de Deus.

Entendo que Deus tem interesse que seus filhos conheçam a verdade sobre a sua salvação, e que por isso ele mesmo me guiou neste processo. E cada vez que alguém questiona: “Você é calvinista?”, respondo com alegria: “Sou calvinista, GRAÇAS A DEUS”. Sim, graças a Deus!

Soli Deo Gloria.

Leonardo Gonçalves
Piura, Verão de 2011
quarta-feira, 11 de setembro de 2013
Uma expectação vívida da Parousia deveria ser encontrada na Igreja hoje, como era encontrada na Igreja Primitiva. Qual é o significado desta expectação? Os críticos do Cristianismo, freqüentemente, gostam de dizer que esta expectação leva a um tipo de “vida de outro mundo” ou, seja, a uma vida improdutiva - uma espera passiva pela vida por vir, inclusive negligenciando nossas responsabilidades neste mundo atual. Será isso verdadeiro? Não de acordo com a Bíblia. Herman Ridderbos, escrevendo acerca do ensino e pregação de Paulo, tem isto a dizer: “O motivo escatológico, a consciência da vinda do senhor como algo próximo, tem não uma negativa mas sim uma positiva significação para a vida no tempo presente. Ele não faz a responsabilidade por esta vida ser relativa, mas antes a aumenta". O que ele diz acerca de Paulo pode ser dito sobre todo o Novo Testamento. Que os escritores do Novo Testamento têm a dizer acerca da significação prática da expectação da Parousia para a fé e a vida? 

A ênfase mais comum é que nossa expectação, pela volta do senhor, serve como um incentivo para um viver santo. Assim, ouvimos Paulo nos dizer, em Romanos 13, que a proximidade dessa volta deveria nos motivar a expulsar as obras das trevas e vestir as armas da luz; a não fazer provisão para a carne, mas conduzir-nos a nós mesmos convenientemente como em pleno dia (vs. 12-14). Em Tito 2.11-13, Paulo destaca o fato de que nossa vida, entre as duas vindas de Cristo, significa que devemos renunciar às paixões mundanas e viver sensata, justa e piedosamente neste mundo atual. Pedro, em sua primeira epístola, nos diz que lançar nossa esperança totalmente sobre a graça que vem a nós, pela revelação de Cristo, significa para nós a busca diligente do auto-controle, obediência e santidade (1 Pe 1.13-15). E em sua segunda carta ele diz o seguinte: “Visto que todas essas coisas hão de ser assim desfeitas, deveis ser tais como os que vivem em santo procedimento e piedade, operando e apressando (ou desejando ardentemente, variante textual) a vinda do dia de Deus...” (2 Pe 3.11-12). O Apóstolo João, em sua primeira epístola, depois de nos dizer quando Cristo se manifestar em glória nós seremos iguais a ele, adiciona: “E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro” (1 João 3.2,3). 

De várias outras maneiras nossa expectativa da Segunda Vinda deveria afetar o nosso modo de viver. A manifestação futura do nosso Senhor deveria nos levar ser fieis à comissão que Deus nos deu, assim como Timóteo o fez (1 Tm 6.14). Se continuarmos a permanecer em Cristo, nós deveremos estar confiantes e sem ter do que nos envergonhar diante dele, quando ele aparecer (1 Jo 2.28). A percepção de que, quando o Senhor vier, ele revelará os propósitos dos nossos corações, implica em que não devemos pronunciar julgamentos prematuros sobre outras pessoas (1 Co 4.5). Sermos fiéis e sábios mordomos de tudo o que o Senhor nos tiver confiado para cuidar é outro meio de mostrar que estamos prontos para a volta do Senhor (Lc 12.41-48). Na parábola dos talentos e das minas dá-se ênfase a que a prontidão para a volta de Cristo significa trabalhar diligentemente para ele com os dons e habilidades que ele nos tem dado (Mt 25.1-40; Lc 19.11-27). E, à luz do juízo final, encontrado em Mt 25.31-46, o melhor modo de se estar preparado para a Segunda Vinda, é estar continuamente mostrando amor àqueles que são irmãos de Cristo. 

Nossa expectação pela volta do Senhor, portanto, deveria ser um incentivo constante para viver para Cristo e para o seu Reino, e para buscar as coisas que são lá do alto, não as coisas que estão sobre a terra. Mas o melhor modo de buscar as coisas lá de cima é estar ocupado para o Senhor aqui e agora. 

Anthony Hoekema
In: A Bíblia e o Futuro.
terça-feira, 10 de setembro de 2013
Bem que deveriam tremer todos, diante de um Deus tal! Tratar desconsideradamente Aquele que pode esmagar-nos mais facilmente do que nós a uma traça, é suicídio. Desafiar abertamente Aquele que esta revestido de onipotência, que pode rasgar-nos em pedaços ou lançar-nos no inferno na hora que quiser, é o cúmulo da insanidade. Para reduzi-lo ao seu plano mínimo, é simplesmente parte da sabedoria dar ouvidos à Sua ordem: "Beijai o Filho, para que se não ire, e pereçais no caminho, quando em breve se inflamar a sua ira..."  (Sl 2:12).

Bem que a alma iluminada deve adorar um Deus tal! As estupendas e infinitas perfeições de um Ser como Deus requerem fervoroso culto. Se homens de poder e renome reclamam a admiração do mundo, quanto mais deve o poder do Onipotente encher-nos de assombro e mover-nos a prestar-Lhe homenagem. "O Senhor, quem é como tu entre os deuses? Quem é como tu glorificado em santidade, terrível em louvores, obrando maravilhas?" (Êx 15:11).

Bem que o santo pode confiar num Deus tal! Ele é digno de implícita confiança. Nada Lhe é demasiado difícil, Se Deus fosse limitado em poder e força, aí sim, poderíamos ficar desesperados. Mas, vendo que Ele Se reveste de onipotência, nenhuma oração é tão difícil que Ele não possa responder, nenhuma necessidade é tão grande que Ele não possa suprir, nenhuma cólera é tão forte que Ele não possa subjugar, nenhuma tentação é tão poderosa que Ele não nos possa livrar dela, nenhuma miséria é tão profunda que Ele não possa aliviar, “... o Senhor é a força da minha vida; de quem me recearei?" (Sl 27:1). "Ora, àquele que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera, a esse glória na igreja, por Jesus Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre. Amém" (Ef 3:20-21).

A. W. Pink
In: Os Atributos de Deus.
segunda-feira, 9 de setembro de 2013
Querido Rick,

Espero que continue firme em sua fé em Cristo e que sua preocupação com minha saúde espiritual tenha diminuído, depois das explicações que lhe dei sobre o que eu creio a respeito da predestinação. Na minha primeira carta, disse que o calvinismo não era uma seita, mas uma posição amplamente assumida na história da igreja. De fato, penso ter demonstrado que a Bíblia ensina uma doutrina da predestinação e que rejeitar a predestinação implica rejeitar o ensino bíblico. Na segunda carta, expliquei que predestinação não pode significar algo posterior ao ato de crer, baseando-me no significado bíblico do termo e nas construções frasais em que o mesmo ocorre. E na minha última carta, respondi às suas objeções de que a doutrina da predestinação torna Deus injusto por fazer acepção de pessoas e que tornaria vãs a morte de Jesus e a pregação do evangelho. Você não disse o que achou das minhas respostas, mas penso que as considerou, pois em sua última e breve resposta disse que o homem tem livre-arbítrio, que não é um robô e que tem direito de escolha.

Pelo que entendi de seu raciocínio, se Deus predestinou pessoas para a salvação, então o homem não teria livre-arbítrio e não tendo livre-arbítrio não seria mais que um robô, que age mecanicamente sem fazer escolhas pessoais. Gostaria de repensar com você essas afirmações. Porém, não estou bem certo do que você entende por livre-arbítrio, parece-me que é algo como “direito de escolher por si mesmo”, levando em conta a analogia do robô que não faz escolhas pessoais. Minha resposta é para essa ideia de livre-arbítrio.

Em primeiro lugar, peço que note que estamos mudando o foco da nossa conversa, saindo do tema “o que Deus faz” para “o que o homem tem”, embora continuemos falando da salvação. É a ordem certa das coisas, porém a sua mudança de foco não é do tipo “tendo considerado como Deus é e age, vejamos suas implicações no que o homem é e faz”, mas “se o homem é assim, então Deus não pode ser e agir dessa forma”. Você ainda está resistindo à ideia de um Deus que predestina e O está medindo com régua humana e, acredite-me, isso é não só impossível como tentar é perigoso e pecaminoso. Devemos, antes de tudo, entender e aceitar o que a Bíblia diz sobre a pessoa e a obra de Deus e só então voltar o nossos olhos para o homem, estudando-o sob a luz que temos do Senhor.

Segundo, a simples predestinação de pessoas para a salvação não exige necessariamente a inexistância de livre-arbítrio. Bastaria, por exemplo, que Deus predestinasse para a salvação aquelas pessoas que Ele, olhando da eternidade, viu que fariam bom uso de seu livre-arbítrio. De fato, há pessoas que creem na predestinação dessa forma. Eu pessoalmente rejeito essa saída, mas ela serve para mostrar que crer na predestinação para a salvação não contradiz o livre-arbítrio, desde que aquela seja modificada de soberana e graciosa para condicional e dependente de uma ação prevista do homem.

Por outro lado, e em terceiro lugar, ser o livre-arbítrio possível não implica que o homem o tenha. Ao contrário da predestinação, que você reluta em admitir, o livre-arbítrio não é declarado na Escritura. Isto não basta para negar sua existência, mas deveria esfriar o fervor com que muitos o defendem. E admitindo-se que Deus tenha criado o homem com livre-arbítrio, ele passou incólume pela Queda? Dizer que o homem natural, caído, tem livre-arbítrio, tal como tinha no Éden é diminuir, senão negar completamente, o efeito devastador do pecado na natureza humana. É aceitável dizer que o homem tem arbítrio, mas devemos aceitar que tal arbítrio não é livre, mas cativo, pois aquele que é vencido torna-se escravo do vencedor. A Bíblia descreve o homem como escravo, escravidão que inclui a sua vontade.

Em quarto lugar, não ter um arbítrio livre não faz do homem um robô de carne. Um cão não tem livre-arbítrio, age por instinto. Mesmo assim, a diferença entre um cão e uma máquina é, em todos os aspectos, assombrosa. Não ter livre-arbítrio não transforma um cão numa máquina. E há outro abismo igualmente enorme entre um cão e um homem. Por que então o fato de ter um arbítrio escravizado tornaria o homem menos que um cão? A afirmação de que sem livre-arbítrio o homem um robô é infantilmente tola. O que distingue e coloca o homem acima de todos os seres e coisas criadas na terra não é o livre-arbítrio, mas a imagem de Deus que ele carrega.

Em quinto e último lugar, quando digo que o homem não tem um arbítrio livre, não quero dizer que ele não faz escolhas. Faz, e o faz de forma livre, no sentido de que escolhe sem coerção externa. Porém, considerada a sua natureza caída e sua inclinação para o pecado, não tem tem capacidade, por si só, de realizar boas escolhas espirituais, como a de crer e ir a Cristo. Em suma, não nego que o homem natural realize escolhas, mas afirmo que entregue a si mesmo ele sempre escolhe o pecado e nunca o que é aceitável a Deus.

Concluindo, o livre-arbítrio não é uma prova de que a predestinação bíblica não existe, pelo contrário, a existência do livre-arbítrio é que carece de prova escriturística. Além disso, não ter um arbítrio livre não transforma o homem em robô, pois o que o distingue como homem é a imagem de Deus e ele de fato continua fazendo escolhas, mas no que se refere ao bem espiritual é incapaz de boas escolhas.

Soli Deo Gloria